Pe. Ângelo José Adão, scj
“Contudo, se vos desagrada servir ao SENHOR, escolhei hoje a quem quereis servir: se aos deuses a quem vossos pais serviram no outro lado do rio ou aos deuses dos amorreus, em cuja terra habitais. Quanto a mim e à minha família, nós serviremos ao SENHOR”. (Josué 24,15)
Corajosa e profética foi a atitude de Josué, quando toma a decisão de manter-se firme ao compromisso de seguir e servir a Deus. Em sua época, muitas coisas tornavam o culto e a fé algo impraticável. Não muito diferente de hoje.
Em sua época, seguir ao Deus Uno e Verdadeiro era coisa perigosa, pois, se perderia o prestígio social, o privilegio político e até mesmo o vínculo cultural. Mas Josué decide ser fiel à promessa de seguir a Deus. Ele era movido pela fé e pela consciência. A fé lhe dizia que Deus havia libertado seu povo e o conduzido até terras seguras. A sua consciência dizia que não se traem princípios em troca de privilégios.
Hoje, ter uma cruz na parede de uma sala pode ser perigoso demais. Por outro lado, também pode não dizer nada para as pessoas daquela sala. Vale a consciência do símbolo. Tirar ou não tirar as cruzes do ambiente público? Nós, os católicos, não perdemos muito com isso. Perdemos mais quando políticas de morte são coniventes com os injustos e os corruptos. Perdemos quando não somos justos com os marginalizados. Perdemos quando não nos importamos com o rumo que nosso país pode tomar se a exclusão se tornar algo banal.
E o crucificado? O Crucificado continuará presente nos tribunais, nas câmaras, nas delegacias, nas escolas e nas ruas. O Crucificado está e estará sempre representado por aquele que é injustiçado. Por aquele que é silenciado pela violência. Por aquele que é descriminado. O Crucificado está e estará sempre presente na frágil criatura que tem o seu corpo e sua dignidade tratada como lixo.
Dizemos que nosso tempo é de “liberdade” e que hoje se pode ser e dizer o que quiser. Muitos dizem isso com desafogo, já que foram, em outras épocas, vítimas da privação da liberdade. Hoje os homens tem mais liberdade de expressar seus sentimentos. As mulheres tem a oportunidade de mostrar sua força atrás da aparente fragilidade.
Se diz que hoje há mais liberdade de opinião , de religião e opção sexual. Hoje se diz que os papéis sociais se igualaram. Todos podem tudo. Quando se diz na palavra “sacrifício”, “privação” e “negação” surge um frenesi e um levante de revolta. Diz-se que as pessoas já foram muito reprimidas pelo preconceito, pela religião, pela política, pela cultura. Como forma de contra-atacar, se libera toda a energia supostamente reprimida. Contudo, esse caminho acaba por conduzir a um outro extremo, aquele onde não existe sacrifício, aquele onde a abnegação e a renúncia não podem ser ditas. Surge aí mais uma opressão, tão terrível quanto as outras surgidas em outras épocas.
O ser humano se esquece que como animal racional, ele é o único que constrói sua vida através de decisões e adesões. Através de razões que ultrapassam os instintos. Essa possibilidade de construir a própria vida e de dar sentido a ela eleva o ser humano àquilo que se chama transcendente, ou seja, eleva-o para além de si mesmo. Ora, para decidir é preciso negar outras coisas. Mas sem um sentido para a vida, as decisões acabam sendo caóticas, animalescas e apenas instintivas.
Aqueles que aderem a Cristo, não aderem a uma meia-verdade. Cristo nunca ofereceu metade do bem. Sua adesão ao projeto do Pai foi total e, inclusive, assumiu as consequências da verdade e do amor à humanidade.
Aderir a Cristo exige renúncia ao pecado e a injustiça. Ser cristão é correr o risco de ser uma “ilha” isolada dentro da incoerência que uma sociedade possa construir. Contudo, o cristão nunca está sozinho. Nossa adesão é fortalecida pela Graça de Deus. É verdade! Não sabemos exatamente como agir em todas as situações da vida, mas “a quem iremos, em quem buscaremos conselhos, se somente Cristo é quem tem Palavra de vida eterna?”.
Aderir a Cristo é pelejar contra a injustiça (na política, na cultura, na ciência e até mesmo nas religiões). Cremos que a justiça, o bem e a verdade estão acima das alianças partidárias, culturais e sociais e, portanto, não podemos ser impassíveis. Devemos respeitar até mesmo o injusto, mas não podemos permitir a injustiça.
Aderir a Cristo não é fácil e nunca foi dito o contrário. Mas nossa adesão não é por puro prazer de sofrimento. Não aderimos por fetiche e masoquismo. Aderimos a Cristo porque cremos em suas palavras. Porque sabemos que a Salvação nos é oferecida e pela fé participamos dessa salvação que será explicitada um dia, de modo mais pleno.
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