O dia em que nascemos

Fr. Ângelo José Adão, scj.

E sobre a Vigília Pascal... Muitas vezes ouvimos dizer que os cristãos têm o costume de “enterrar” o seu Senhor na sexta-feira da Paixão, mas esquecem de “ressuscitá-lo” no sábado de aleluia. Talvez isto não se dê tanto por esquecimento, mas por desconhecimento. É verdade que onde se tem o costume de celebrar o “descimento do Senhor da cruz”, as praças (ou igrejas) ficam cheias. Porém, no Sábado à noite as igrejas não apresentam o mesmo número de fiéis. Este fato se dá, em muitos casos, por acharmos mais importante ou sermos mais devotos da sexta-feira da Paixão do que da Vigília Pascal no Sábado. Outras pessoas alegam que a missa é muito demorada, às vezes até chata. “Tem muita cantoria, e, nada mais, nada menos do que oito leituras, sete salmos responsoriais e mais o evangelho”. Porém, aqueles que se fazem atentos ao espírito da Páscoa acabam por concluir que é, de fato, a celebração mais bonita que já participaram.
Para que a celebração da Vigília Pascal seja bem vivida são necessários três elementos importantes: uma boa preparação da equipe litúrgica, uma compreensão maior dos fiéis sobre os riquíssimos símbolos desta celebração e uma íntima preparação espiritual de cada fiel.
A equipe litúrgica tem a missão de preparar com bastante antecedência esta celebração. Para isto é preciso da participação de todo pessoal da música, leitores, coroinhas, sacristãos, comentaristas, ministros da Eucaristia e, se possível, o diácono e o padre. É preciso repassar o esquema da celebração, as suas partes que convêm cantar, os detalhes do material litúrgico, bem como da ornamentação. Deve-se ter cuidado com a acomodação do povo, pois de fato é uma celebração de longa duração. Depois de tudo pronto, é só esperar a festa!
A celebração da Vigília Pascal é, em muitas das suas partes, auto-explicativa, mas convêm que a equipe litúrgica conheça alguns dos seus símbolos e ritos principais. A catequese também é responsável por educar as crianças e jovens sobre tais significados.
Temos, já no início da celebração, a parte chamada de “lucernário”, ou seja, celebração da Luz: o povo reunido ao redor de uma fogueira participa da benção do fogo novo que dará luz ao Círio Pascal. O fogo novo representa Jesus Ressuscitado vencedor da escuridão da morte e do pecado e que se torna Luz Vital. Ao adentrar a igreja em penumbra, o presidente da celebração proclama a “Luz de Cristo” que ilumina nossa vida. Também os fiéis adentram a igreja como povo que segue a “Coluna de Fogo Luminosa”, tal qual Deus guiando o povo para fora do Egito (Ex 13,21). Na segunda aclamação da “Luz de Cristo” o povo acende suas velas no Círio Pascal compartilhando da luz do Ressuscitado.
Antes da terceira aclamação as luzes da igreja são acesas. Depois de aclamada a “luz de Cristo” o diácono ou o presidente proclama a Páscoa com o canto do Precônio Pascal apelidado de “Exultet”. Este belíssimo canto, quando cantado de modo apropriado, permite compreendermos de forma poética o Mistério do Amor de Deus em nossa história.
A segunda parte da celebração é a Liturgia da Palavra que, com um número maior de leituras e salmos, descreve e proclama a História da Salvação passando pela criação, aliança de Deus com o homem, libertação da escravidão do Egito e as profecias sobre a vinda do Cristo salvador. Depois da sétima leitura o presidente evoca o Hino de Louvor (Glória) que é acompanhado por toda a assembleia de modo alegre e festivo. Há ainda uma carta paulina exaltando a ressurreição. Tudo isto culmina na narração evangélica sobre a Ressurreição que é antecedida pelo solene aleluia, aquele que estava “engasgado na garganta” durante o tempo de conversão quaresmal. Os salmos que intercalam as leituras são as respostas ao amor de Deus na nossa historia. As orações expressam nosso desejo de continuar caminhando como povo eleito.
A terceira parte é a Liturgia Batismal. Os batizados celebrados nesta noite enriquecem o sentido da celebração mas, mesmo quando não há batizados, esta parte faz referência a todos os cristãos convidados a renovar sua fé no Cristo. A benção da água batismal, a imersão do Círio Pascal, a ladainha dos santos e o rito batismal são as expressões do nosso renascimento das águas renovadoras e revigorantes do Batismo.
A Liturgia Eucaristia é a quarta parte desta celebração. Uma vez que a vitória da Ressurreição dá novo sentido a imolação (paixão e morte) do nosso Cordeiro Redentor, nós, como cristãos, pelo batismo participamos sacramentalmente da imolação e glorificação de Cristo presente na Eucaristia. É por isto que dizemos que a Eucaristia nos torna “outro Cristos”, redimidos, revitalizados e também comprometidos com a caridade.
A Celebração da Vigília Pascal tem outros símbolos e significados que ao serem conhecidos torna a nossa participação mais motivada e consciente. Fica aqui um convite para buscarmos conhecê-los de modo mais aprofundado.
Há ainda um terceiro elemento que torna a nossa participação na Vigília Pascal mais consciente: a nossa disposição interna de celebrar o Mistério Pascal. Se o fiel não se dispuser a participar “em espírito e verdade”, de nada servirá para si os preparativos da equipe litúrgica e o conhecimento litúrgico da celebração. Podemos entender esta preparação assim: quando alguém prepara uma ceia, o cheiro da comida, as cores dos enfeites, as músicas que preparam o “clima” do banquete. Tudo isto põe a família ansiosa para a refeição. Porém, se logo na preparação as pessoas começam a beber e a beliscar a comida, na hora da refeição não haverá apetite, nem disposição física para participar. Assim também é conosco. O recolhimento interior da sexta-feira da Paixão e o silêncio da manhã do Sábado devem nos conduzir a uma ansiosa espera para a festa da Ressurreição.
Enfim, pelo próprio batismo o cristão participa da Ressurreição de Cristo. Nele nós recebemos uma vida nova: “Ou vocês não sabem que todos nós, que fomos batizados em Jesus Cristo, fomos batizados na sua morte? Pelo batismo fomos sepultados com ele na morte, para que, assim como Cristo foi ressuscitado dos mortos por meio da glória do Pai, assim também nós possamos caminhar numa vida nova” (Rm 6,3-4). Ora, assim como nunca se ouviu dizer que alguém estivesse ausente no dia do próprio nascimento, assim também não podemos faltar daquela celebração que é para nós vida nova.

REFERÊNCIAS PARA ESTE ARTIGO:

BERGAMINI, Augusto. Cristo festa da Igreja – o ano litúrgico. São Paulo: Paulinas.  p. 351-376.

CNBB. Roteiros homiléticos da Semana Santa e Tempo Pascal ano C 2007. São Paulo: Paulinas. 2007.110p.

CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II. “Constituição Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia”. In Compêndio do Vaticano II - constituições, decretos, declarações. 19a. ed. Petrópolis: Vozes, 1987, p. 259-306.


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